Rompendo os sapatos... no mundo das lendas de Matosinhos.

Matosinhos é a cidade vizinha do Porto, que começa logo a seguir à foz do Douro.
É cidade do mar, da pesca, das antigas fábricas de conservas, dos restaurantes de peixes e mariscos, do Porto de Leixões... e das lendas. Lendas tão enraizadas na história da cidade e na sua tradição que são quase... histórias.
E em mais uma etapa do "Romper os sapatos" com o historiador Joel Cleto, fui conhecer e/ou reviver estas lendas nos locais onde elas surgiram.
E tudo começa na praia de Matosinhos, a praia que deu nome à cidade, onde hoje está o grande molhe do Porto de Leixões. Onde vamos conhecer a lenda de Cayo Carpo...



 a lenda que está associada a criação do nome da cidade e também ao facto da concha da vieira, ser o símbolo do Caminho de Santiago de Compostela.

Cayo Carpo era um romano pagão que casou-se com uma gaiense no ano 44 e cuja festa de casamento estava sendo celebrada naquela praia, quando de repente avistaram uma nau a passar em alto mar. O cavalo de Cayo Carpo, quase que desgovernado entra no mar e vai em direção àquela embarcação e some na escuridão. Ao chegar a nau, Cayo Carpo descobre que está diante do corpo do apóstolo Tiago que está sendo levado para a Galiza onde irá ser enterrado, onde hoje é a cidade de Santiago de Compostela. Diante daquilo Cayo Carpo converte-se imediatamente ao cristianismo e ao voltar à praia, ele e o seu cavalo saem do mar cobertos de vieiras, matizado de conchas. E por isso aquela praia passou a ser conhecida como Matizado, depois Matizadinho, até o nome atual: Matosinhos.
Eu, particularmente, adoro esta lenda. O meu lado romântico, gosta de saber que por este mar tão próximo de nós, passou o corpo de Santiago de Compostela e que as conchas que são o simbolo do Caminho, também surgiram deste mar. Daqui veio mais uma inspiração para eu fazer o meu Caminho Português de Santiago


Mas, ainda há outras lendas em Matosinhos, e por isso começamos a romper os sapatos para a poucos passos dali, encontrarmos um Monumento Nacional, o Zimbório do Senhor do Padrão...



Hoje, este monumento que foi construído em meados do séc. XVIII, está quase escondido entre a urbana Matosinhos e o Porto de Leixões, que foi construído no final do séc. XIX e que alterou por completo a paisagem ribeirinha de Matosinhos.
Antes da construção do Porto, o Zimbório do Senhor do Padrão destacava-se no extenso areal da praia de Matosinhos, que podia ser visto a longas distancias, tanto em terra como no mar.

Aqui, Joel Cleto conta-nos porque este monumento foi construído...


Segundo a lenda, foi exatamente neste local que em 03 de maio de 124 surgiu no areal, uma imagem em madeira do Cristo crucificado, que viria a ser chamada do Bom Jesus de Bouças, porque foi enviado para o Mosteiro de Bouças ali mesmo em Matosinhos.
E há ainda ao lado do Zimbório, um monumento que sinaliza  a existência de uma fonte de água doce, de origem inexplicável, uma vez  que está localizada em uma praia, e teoricamente deveria ser de água salgada...



Voltando à imagem que surgiu à praia no ano 124 e que foi levada ao Mosteiro de Bouças, com a construção da Igreja de Matosinhos no século XVIII, é para lá que ela foi transferida e lá está até os dias de hoje e é onde  vamos saber como é que esta imagem teria surgido neste areal.
Mas daqui até a Igreja de Matosinhos, vamos romper os sapatos por lugares tão antigos da cidade e que passaram a ficar escondidos na malha urbana atual de Matosinhos, devido à chegada do Porto de Leixões, não como forma de crítica com o surgimento do porto, mas sim para conhecermos lugares que fizeram ou fazem parte da história de Matosinhos....


Matosinhos sempre foi uma vila de pesca, e lá estão as casas dos pescadores e da gente da terra...



E por falar em pesca, é no Mercado de Matosinhos, o mercado tradicional pela venda de peixes e frescos, a nossa próxima paragem...


e é lá que o Joel Cleto, sob o olhar atento das vendedoras, conta a história da necessidade do surgimento deste mercado, que antigamente era um grande mercado ao ar livre e também os detalhes da sua arrojada arquitetura da metade do séc. XX...



A poucos metros dali, encontramos as ruínas da antiga Capela de Santo Amaro, uma das muitas construções que desapareceram com a chegada do Porto de Leixões...




Seguimos rompendo os sapatos por ruas estreitas, por edifícios históricos...







e por recantos tão especiais e quase "secretos"...




E já avistamos a Igreja do Senhor de Matosinhos, onde vamos saber como teria aquela imagem surgido no areal da praia de Matosinhos...


Esta belíssima construção de meados do séc. XVIII, com a fachada barroca projetada pelo famoso arquiteto Nicolau Nasoni.


No seu interior, encontramos um altar mor, que é um dos mais belos do país com um trabalho de talha dourada incrível!



E ali encontra-se a imagem do Cristo na cruz, que surgiu na praia em 03 de maio de 124...


Joel Cleto conta-nos que, Nicodemos e José de Arimateia, ali também representados no altar mor retiraram o Cristo da cruz e o envolveram no Santo Sudário para o transportarem para o sepulcro...


e, segundo a lenda, Nicodemos, trabalhava muito bem a madeira e se inspirou na imagem de Cristo no Santo Sudário para fazer várias imagens dele na cruz, trabalhadas em madeira. Perseguido pelos romanos e pelos judeus e com medo de ser acusado como cristão, ele teria jogado todas as imagens no mar. E esta, veio parar ao mar de Matosinhos.

Não se sabe ao certo, quantas imagens teria Nicodemos lançado ao mar, o que se sabe é que na costa mediterranea, em Portugal, no Sul da Espanha e na Galiza há mais de 20 imagens de Cristo na cruz associadas a lendas semelhantes a esta do Senhor de Matosinhos.

O fundo de verdade de tudo isto é que esta é a mais antiga  imagem do Cristo na cruz em tamanho natural no país...


Segundo historiadores da arte há pormenores que mostram a antiguidade da imagem, como por exemplo os pés estarem pegados separadamente e também a expressão de serenidade da imagem.
Trata-se de um trabalho realizado nos primeiros momentos do cristianismo, logo após a sua crucificação.
Vale a pena ir a Matosinhos conhecer o Senhor de Matosinhos, que curiosamente, não é o padroeiro da cidade.
O padroeiro de Matosinhos, também está lá naquela igreja. Quase passa despercebida, a imagem ao alto do altar mor de São Salvador...


Já do lado de fora, Joel Cleto vai nos falar do jardim da igreja composto por várias capelinhas que tem no seu interior cenas das passagem bíblicas referente ao calvário de Cristo...





e rompemos mais um bocado os sapatos para encerrarmos este percurso junto aos belíssimos painéis de azulejos pintados pelo artista da cidade, José Emídio, em 1996...



onde estão retratadas cenas da história e das lendas de Matosinhos...



Que maneira fantástica de encerrar esta etapa... com os sapatos junto a um trabalho artístico incrível, que eu faço questão de mostrar por completo num post em breve....


Para quem programar a sua viagem ao Porto e região no mês de Maio, pode aproveitar a oportunidade de conhecer todos estes locais em Matosinhos e ainda conhecer a cultura e a tradição da cidade na festa que é uma das mais importantes da região Norte. A Festa do Senhor do Matosinhos.
Basta acompanhas o site: www.cm-matosinhos.pt/  para ficar sabendo as datas desta festa e a sua programação.


Quem ainda não leu a os posts do blog das etapas anteriores do "Romper os Sapatos" pode ver os links abaixo:
Lendas do Dragão e dos Tripeiros
Lendas e Histórias entre a Praça dos Leões e Massarelos
Lendas e Histórias de Vila Nova de Gaia

Por entre as histórias e as lendas que encantam!

Comentários

  1. Mas é realmente uma delícia de descobertas este blog. Adoro as histórias, Rita! bjo.

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  2. Belo relato repleto de bons pormenores embrulhados numa maresia rica de lenda, arte e memórias várias. Parabéns.

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  3. Parabéns pelo belíssimo relato da riqueza das lendas de Matosinhos. Proponho que pense na edição de um livro com o registo destes apontamentos.

    Joaquim Faria

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    1. Muito obrigada Sr. Joaquim Faria pelas suas palavras. Mas os livros, são especialidades do Joel Cleto que é um ótimo contador de lendas e de histórias. Mas mesmo assim, obrigada pela sugestão.

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